terça-feira, 28 de outubro de 2008

O tempo é nosso


Pensamentos descompassados, lágrimas paralelas e sincronizadas.
Passo pelo tempo sem que o sinta, somente sinto o seu peso que recai agora sobre mim. Talvez, por isso, me falte o ar e flua em mim uma vontade louca de correr o mundo num só grito, ou num só gesto. Tudo isto na esperança vã de libertar o que se acumula na minha alma, no meu ser.
Os ponteiros do relógio não me obedecem, seguem o tic-tac. Os dias são curtos, as noites longas.
Já não sei onde te irei procurar. Encontro vestígios da tua presença, mascarados de pistas falaciosas da tua chegada.
Quando partes levas toda a minha força e coragem. Quando partes levas o tempo que avança veloz. Quando partes levas os nossos sorrisos. Quando partes levas os nosso abraços e beijos. Quando partes levas a minha inspiração. Quando partes não levas nada e levas tudo.
Faz da tua chegada a tua permanência, vem escrever a nossa vida, viver a nossa história.
Já fizemos tudo o que podíamos das palavras. Já as escrevemos, falámos, gritámos, segredámos, sonhámos e concretizámos. Agora chegou a hora de inventar novas palavras, dar-lhes voz pelo olhar e escrita pelos lábios.
Tic-tac.
O mundo avança e nós perdemo-nos do que procuramos e lutamos, mergulhados na saudade do que não foi e na convicção do que será.
Não deixes de acreditar nesta história, nem de a querer escrever, vivendo-a.

sexta-feira, 17 de outubro de 2008

Carta de amor

Quando o Sol raiou esta manhã, nasceu em mim esta vontade de te oferecer um presente. Um presente feito de palavras, embrulhadas em emoção e sentimento.
Vou pedir-te segredo. Guarda segredo. Vou escrever-te amor. Lê baixinho, lê junto ao mar.
Perdi a minha sombra, conquistei a tua. Adoro vê-la sobre o passeio dos meus passos. Identifico o limite da tua pele nos seus contornos, e encontro-me entre o limiar dos teus braços. É esta sombra que ganha vida e no sopro do vento traz-me o teu toque, dá-me a mão e conduz-me entre os caminhos do meu destino.
Com o chegar do final do dia torna-se cada vez mais difícil encontrar esta sombra que por ser tua é minha, nessa altura, tudo escurece. Chega a noite pura. Escura. Brilhante. Tudo em mim é falta, é saudade, é ansiedade, mas nunca ausência.
Podes estar longe, muito longe, muito, muito, muito longe, mas nunca estarás ausente. Porque a minha existência é igual à tua presença.
Há em ti o significado da eternidade, sabias? Nada será breve nem finito. Tudo será para sempre.
Será sempre a tua sombra que me acompanhará e guiará. A minha? É tua. Sempre será. A minha sombra, assim como, todo o meu ser o é. Este ser que te procurou incessantemente, que te encontrou e que não mais partiu de ti.
Guarda segredo de toda a minha entrega. Sim, guardas? Guarda-me a mim também, porque a minha existência é a tua presença e assim nunca nos perdemos nesta eternidade que és tu e o meu amor e o nosso amor.

Até sempre.Até à eternidade.Até ti.

sábado, 4 de outubro de 2008

Felicidade


Margarida considerava-se uma mulher forte, capaz de travar muitas batalhas e aprender a viver com o sucesso ou o fracasso das mesmas. Efectivamente, havia uma luta que a acompanhava há vários anos e na qual não se declarava vencedora. Margarida não podia ter filhos.Nunca conseguirá apagar da sua memória o dia em que tal coisa lhe foi dita. Dois anos depois, lá estava ela, sentada no mesmo banco de jardim, um dos muitos que circundavam o parque infantil existente perto do bloco de apartamentos onde residia. Talvez por coincidência, talvez não, voltava a sentir necessidade de estar naquele lugar, onde todo o seu ser sentia uma mistura imensa de sentimentos, mas de todos prevaleciam apenas uma tristeza e angústia profundas. Naquele dia, fora o pedido de casamento de João que a conduzirá até lá. Nunca tinha reunido forças suficientes para lhe contar.O João era sem dúvida o homem da sua vida e Margarida sabia que lhe deveria ter dito desde início. Ao contrário do que se passava com a maioria das mulheres, Margarida não tinha adiado o anúncio da sua infertilidade por ter medo de perder o homem que amava, mas, sim, por ter medo que ele lhe olhasse de uma outra forma.Continuaria a orgulhar-se de tê-la como mulher? O pedido de casamento feito naquela manhã manter-se-ia? Conseguiria o João lidar com a pressão familiar?Margarida sabia que não poderia adiar mais aquele momento e, por isso, ligou a João para que não se perdesse no trabalho e viesse assim que possível ter com ela ao seu apartamento.
- Deixaste-me preocupado, querida, o que se passa? – questionou João mal Margarida abrira a porta, virando costas e aproximando-se da janela. Naquele momento, não queria contacto directo com João, queria que ele se sentisse livre para tirar um tempo para percebê-la.
-Senta-te, temos que falar. Há uma coisa que nunca te disse nestes dois anos. Tenho noção que foi uma tremenda cobardia da minha parte, mas, na verdade, acomodei-me à ausência desta verdade entre nós e ao facto de eu própria poder viver como se ela não existisse, e nesse aspecto fui egoísta.
- Margarida, importas-te de ir directa ao assunto? Estou seriamente assustado neste momento. - disse João fazendo Margarida voltar a virar-se na sua direcção. Na posição em que estava, agora, contra a janela fez com que o seu rosto fosse subitamente iluminado deixando João absolutamente compenetrado na sua beleza e com uma grande vontade de a fechar entre os seus braços.
- Tens razão, é melhor ir directa ao assunto…João... eu não posso ter filhos. – disse Margarida de uma forma que não podia ter sido mais seca, deixando João sem qualquer reacção.
No fim dessa mesma noite, Margarida ocupava o lugar onde João tinha estado sentado, chorando compulsivamente sem uma única paragem, ao fim de todas aquelas horas. João tinha tomado uma posição que Margarida nunca tinha temido. Simplesmente achava-a impossível, visto estar segura do amor de João por si. Estava preparada para todas as situações, menos para o fim da relação de ambos, sem uma única hesitação por parte de João. Nem conseguia pensar nas palavras que ele lhe dissera, as mais frias e más que alguma vez ouvira em toda a sua vida.Um mês mais tarde, Margarida tinha reformulado toda a sua vida. João não tinha voltado a procura-la e ,na verdade, depois da discussão de ambos era Margarida quem não queria ficar ao lado de João. «Se não podes ter filhos não faz sentido casarmos nem continuarmos esta relação, nunca teremos nem seremos uma família.». Era com o autor destas palavras que Margarida quase tinha casado, no entanto, não se tinha arrependido da relação que vivera durante os últimos dois anos, tinha-a ensinando a viver com uma realidade, difícil é certo, mas a sua realidade. Margarida aprendera a falar da infertilidade como sempre falara de outras características individuais que a distinguem de todas as outras pessoas no seu conjunto. Continuou a sentar-se no banco do jardim, contudo agora isso devia-se ao desejo de adoptar uma criança ou duas, quem sabe?É nas verdadeiras dificuldades que o amor se revela ou se ausenta. Só o verdadeiro amor vence batalhas e resiste ao tempo. Só o verdadeiro amor une duas pessoas independentemente de tudo e de todos. O amor que unira João e Margarida ausentou-se, não era um verdadeiro amor, só valendo a pena ser vivido para aprender uma lição e Margarida aprendeu-a.Margarida esperava pela disponibilidade dos papéis de adopção de Guilherme e Juliana, desde poucos dias depois da sua separação de João.
Guilherme e Juliana eram dois gémeos falsos, abandonados à porta do orfanato, na véspera da visita de Margarida a essa instituição. Tinha -se apaixonado logo no primeiro olhar, o choro das crianças fê-la debruçar-se no berço de ambos e só várias horas depois, na hora do fecho do orfanato é que Margarida fora obrigada a deixá-los, para na manhã seguinte voltar mal o orfanato abrira. Algumas semanas depois já os tinha em casa.Margarida jamais se sentira tão feliz como o fora a partir do dia da adopção dos seus filhos, só este grau de parentesco faz sentido atribuir perante alguém que tanto ama e quer bem, como Margarida sente e quer por e para aqueles dois bebés. A vida amorosa de Margarida também se restabeleceu ao apaixonar-se pelo pediatra de Guilherme e Juliana, o Dr. Pedro. Margarida tinha por fim encontrado o verdadeiro amor, o vencedor.




Nem todos os finais felizes são constituídos por capítulos vitoriosos, o caminho para a felicidade é longo e, por vezes, duro, mas não impossível de ser percorrido. O segredo? Encontrar o verdadeiro amor, o vitorioso.